sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Bater ou não bater: eis a questão!


Muitas vezes tenho sido perguntada a esse respeito e hoje vou tentar desenvolver o assunto de modo a esclarecer a maioria das dúvidas que a mim chegam quase que diariamente: a questão sobre bater ou não nos filhos desobedientes!
É comum ouvirmos alguns pais dizerem que antigamente as crianças apanhavam muito e eram bem mais educadas. Concordo! Eram mesmo! Segundo o senso comum, eram mais obedientes e comportadas. Tinham mais convívio com os pais, que passavam valores de respeito (às vezes de medo), de disciplina e responsabilidade. Nossa sociedade como um todo era muito mais bem educada. Portanto, antigamente, o que colocava a criança na linha não era apanhar e sim o respeito em si, exigido, cobrado, mas antes de tudo, ensinado! Hoje, nossa sociedade está corrompida por valores materiais, onde o “ter” vale muito mais do que o “ser”; onde a impunidade corre solta, onde os pais se sentem culpados por trabalharem fora e estarem ausentes e então compensam os filhos com mimos e agrados materiais. Pais permissivos, já que ausentes; que contratam babás e especialistas de toda ordem, terceirizando o trabalho de educar... Me desculpem, mas devo tocar na ferida; do contrário, não faria sentido o artigo. Obviamente que estou me referindo a uma parcela bastante privilegiada da população; entretanto, guardando-se as diferenças, não é diferente com as classes mais baixas, que lançam mão de outros artifícios para suprir a ausência, deixando o resultado idêntico. A falta de respeito em casa tem sido cada vez mais ocorrente, diante de uma sociedade que cobra, pressiona, fazendo com que pais cheguem em casa já estressados, sem cabeça para mais nada.
Enfim, o quadro todo, atualmente, é bastante desrespeitoso e agressivo. Isto, sem falar da impunidade, do mundo perfeito que se mostra às crianças, criadas na maioria das vezes dentro de cúpulas de cristal, como se o mundo todo, para sempre, fosse se curvar às suas vontades. Tudo isso gera intolerância, gera exigências, mimos, discórdia. Antigamente, como se vê, apesar de os pais baterem em seus filhos, todo o contexto ajudava muito positivamente na formação do caráter do indivíduo. Portanto, atribui-se erroneamente o crédito das crianças terem sido mais educadas no passado por terem apanhado!
Feita a introdução, vamos ao ponto inicial, que é o “bater ou não bater” hoje em dia:
Minha resposta? NÃO! Não bater! EDUCAR, SIM! Sou partidária das correntes educacionais que defendem o desenvolvimento do raciocínio lógico da criança, levando a autonomia moral e social. Não acredito no “bom” comportamento baseado na chantagem ou no medo. Mesmo que aparentemente dê resultados, estes serão falsos, já que a criança não foi levada a pensar, a escolher e a decidir por este ou aquele comportamento. Desse modo, numa próxima vez, poderá agir mal novamente!
Constance Kamii, analisando a obra de Jean Piaget (Juízo Moral na Criança) é bastante clara com relação a isso. Uma criança pega em flagrante fazendo algo errado, se punida com a dor, poderá, numa próxima vez, mentir ou omitir, mas dificilmente deixará de agir assim por sua própria decisão. Por outro lado, se for levada a escolher entre uma atitude boa ou má, se souber claramente quais são as regras e, no caso de não cumpri-las, quais são as conseqüências de seu ato, nunca mais esquecerá como agir corretamente e terá sempre a sensação de ter escolhido, decidido sozinha! Importante salientar que as regras não podem ser variáveis: ou é SIM ou é NÃO. Ou pode, ou não pode, sempre e não de vez em quando!
Quando os pais batem, ensinam agressão! Ensinam que se alguém fizer algo errado, não será perdoado, não terá oportunidade de defesa ou de arrependimento, já que a surra e a dor vieram de todo jeito. Fará assim também com seus amiguinhos na escola, causando problemas irremediáveis futuramente. Aprenderá a agredir. Não aprenderá a analisar regras, a se esforçar por se adequar, a conversar a respeito de erros, não aprenderá a se arrepender. Aprenderá a punir. Apenas isso, sem conscientização nenhuma. Aprenderá a dissimular, a mentir, a ser cada vez mais esperto para não ser pego de surpresa na próxima vez.
Mas, sendo assim, o que fazer? Limite é uma das palavras! Regras claras, consciência de que nossa liberdade não pode ferir a do outro, etc. Firmeza ao chamar a atenção dos filhos: muitos pais fazem verdadeiros sermões, praticamente implorando atitudes corretas de seus filhos. Sermões longos são chatos, ninguém presta a atenção e perdem a força por si mesma. Ao chamar a atenção, não se pode perder o foco e quanto mais simples forem as palavras e frases, tanto melhor! Voz grave, seriedade no semblante, clareza de idéias e pronto! Nada de voz maciazinha, mostrando medo, culpa ou insegurança naquilo que se fala. Também nada de agressividade, de xingamento, escândalo. Se quisermos crianças que respeitem, devemos antes de mais nada respeitá-las! Não se trata dos problemas com brigas, gritos, ameaças e muito menos com chantagem emocional. Trata-se com clareza e possibilidade de ajuda, além da correção do erro. Somos modelo aos nossos filhos; eles irão repetir com os outros, pela vida a fora, exatamente o que tiverem em casa.
Não gosto da conotação “castigo” como forma de sanção – diferente de punição, que dá a idéia da agressividade ou abuso de poder falada acima. Usaremos então o termo sanção, definido por Piaget: “as sanções por reciprocidade salientam a ruptura do vínculo social pelo mau comportamento de uma criança.” Ou seja, para fazer parte ou ter o direito de participar de uma atividade ou de um determinado grupo, deve-se estar adequado a eles; do contrário, não será aceito, não poderá pertencer ao grupo, ou da atividade. Isto é muito diferente de colocar no cantinho para pensar... “Se você quiser pertencer, participar, deverá ser assim. Do contrário, não poderá ficar aqui.” Ou então, “ é sua decisão ficar ou não. Você não é obrigado a nada...” Do mesmo modo, perder certos direitos caso não se comporte conforme esperado ou ganhar certos privilégios por merecimento. Neste ponto, é importante que se diga que não se negocia o bom comportamento. Dá-se a idéia de que tudo na vida tem conseqüências – boas ou más. Retribuir com bens materiais é a pior idéia que se pode ter. O ideal é o reconhecimento, o afago, o abraço orgulhoso, a palavra de carinho como forma positiva de incentivo ao bom.
Pretende-se assim, dar sempre a opção de escolha à criança: “Você tem um brinquedo e pode ou não cuidar dele. Caso cuide, estarei convencida de que você já é grandinho para ter outros e poder brincar em várias situações, etc. Caso não cuide, terei que retirá-lo de circulação, pois você ainda precisa aprender a cuidar de suas coisas.” Pronto, simples assim. Sem escândalos, sem dramas. É justo, não? A vida é assim: tudo tem conseqüências – boas ou más!
Vamos tentar lembrar que o grito, a agressão, a surra, é o argumento de quem não tem argumento! Sejamos éticos e tenhamos filhos ainda melhores e mais centrados!

5 comentários:

  1. Parabéns Gisele, excelente o seu artigo. Muito claro e objetivo.
    Fábio Soeiro

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  2. Giselle,
    Como sempre, gostei do artigo e concordo na maior parte com o que você escreveu.

    Apenas discordo do fato de que devemos abolir ABSOLUTAMENTE a palmada. Em casa, nossos princípios de educação das nossas filhas são Bíblicos e, na boa, "velha" e sempre atual Bíblia, existe um provérbio que diz: Ensina a criança no caminho em que deve andar e, quando for grande, jamais se desviará dele." que, associado a este outro: "O pai que ama, não poupa a vara da disciplina." Permitem que com amor, sem raiva ou revanchismo, uma palmada na hora certa, e no lugar certo, faça com que a criança também entenda o conceito de certo e errado com as proporções adequadas à sua idade e compreensão. Abraço.
    Marcello Burattini S Sousa

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  3. Obrigada a todos pelos comentários e oportunidade de debatermos idéias, já que ninguém é absoluto em pensamentos e idéias. Marcello, foi ótimo falar da "palmadinha". Obviamente que esta é fora da "surra" à qual me referi. Quando a criança é muito pequena, principalmente, ainda vale o condicionamento da palmadinha, do tipo: "mexi aqui, doeu..." (se levou um tapinha). Refiro-me basicamente a crianças maiores que têm compreensão e discernimento e que precisam ser educadas dentro dos princípios familiares - falei da surra, do espancamento com raiva e sem a menor paciência. Espero ter esclarecido! Obrigada novamente por me deixar enriquecer o texto! Abraço a todos, Giselle.

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